Sobre reaprender a ver e enxergar nosso papel no universo

Era uma vez uma célula do olho.

Muito prestativa, sentiu que o nariz precisava dela, e saiu correndo para ajudá-lo a ser um nariz melhor.
Como eram praticamente vizinhos, sabia que num pulinho estaria com ele.
Assim que se encontraram, disse pra ele como ele, o nariz, deveria fazer para acessar novos aromas, pois tinha feito um curso recentemente sobre o tema. Enquanto fazia de tudo para repassar as informações recebidas no curso ao nariz (era muita teoria!), notou que a unha estava tendo problemas e por conta disso se mostrava bastante chateada.

Mais do que rapidamente, pegou uma hemácia que pegaria a avenida dos Braços Abertos, com ponto final na travessa da Mão Esquerda, viajou até o dedo comprometido e dedicou-se a explicar à unha que ela estava fazendo algumas coisas erradas, que se ela não confiasse em si e na sua natureza, ela continuaria crescendo fraca e quebrando à toa.
A unha ouviu com atenção, pois a célula do olho parecia ter muita autoridade no assunto ao falar com tanta propriedade.

Foi quando percebeu que a garganta andava irritada, e não estava conseguindo mais se alimentar nem comunicar o que se passava com ela. Bem intencionada e com um coração gigante, a célula do olho ativou seu aplicativo 99linfa e chamou o primeiro glóbulo branco que pudesse transportá-la até a garganta. Lá chegando, deu altas dicas para a faringe e para a laringe, baseadas num programa que a célula do olho havia assistido no canal Body and Health. A garganta prestou muita atenção, e ao final do encontro agradeceu as dicas (apenas com gestos, pois permanecia sem voz).

Mais tarde, a célula do olho teve um pressentimento: o coração estava triste, parecia ter sido partido, e certamente precisava da sua ajuda. Uma vez mais, nossa heroína parou tudo o que estava fazendo, deixando acumuladas tarefas importantes, mas que ela sabia que deveriam ficar em segundo plano, afinal, alguém estava precisando dela!

Ao encontrar-se com o coração, disse a ele tudo que sabia sobre amor, dor, medos, sobre a necessidade dos átrios de aprender a receber, e a importância de deixar ir (o famoso soltar) para que os ventrículos pudessem cumprir sua missão.

O coração, cansado, ouviu tudo com atenção e amorosidade. Aliás, isso ele fazia instintivamente com todos que tentavam ajudá-lo.

Nisso, o tempo foi passando, a vida foi acontecendo e a célula do olho foi chamada de volta pra casa (um jeito fofo de dizer que ela foi dessa pra melhor, empacotou, foi pro saco, morreu).

Lá chegando, ela sentiu a abertura de um enorme portal de luz, que lhe trouxe grandes arrepios e uma sensação enorme de bem estar.

E neste exato momento você pode me perguntar:
– Mas, Ana, ela era uma célula do olho! Ela não VIU o portal?

Não, amado, ela não viu.
Por estar sempre preocupada em salvar os outros, ela acabou não desenvolvendo seus dons e talentos naturais.
A célula do olho passou tanto tempo querendo resolver os desafios daqueles que ela amava e admirava, fazendo movimentos para deixar a vida deles mais fácil e leve, que ela mesma não teve tempo de fazer isso por si mesma.

Mas, voltando à nossa história:
Ao atravessar o portal, um anjo muito amável sentou-se ao lado dela. Esticou suas mãos angelicais, repartindo uma nuvem branquinha como se fosse um pedaço de pão, e disse, entregando aquele pedacinho de nuvem fofa para a célula do olho:
– Toma, este é seu arquivo de vida, que ficou gravado aqui na nuvem. Está tudo aí!

E pela primeira vez a célula do olho viu coisas que jamais havia enxergado: a luz do Sol, o verde da grama, a chuva caindo, o olhar de amor das pessoas que olhavam pra ela.
Viu pássaros, formigas, cogumelos.
Cores, sombras, nuances. Viu também texturas, formatos, brilhos.
Era tanta coisa linda, que ela nunca havia visto antes, que a célula do olho ficou tão passada, que se ela tivesse um queixo, ele teria caído (e se enterrado centenas de centímetros abaixo da superfície terrestre).

– Que experiência maravilhosa e gloriosa! Ela pensou.
E perguntou ao anjo:
– Por que essas coisas todas estão nos meus arquivos se eu nunca as acessei? Como faço para viver isso?

E o anjo carinhosamente respondeu:
– Estava tudo lá, bem diante dos seus olhos. Mas enquanto tentava melhorar e consertar a vida dos outros, você abriu mão de viver a sua própria vida. Como numa escola, você deixou de fazer sua provinha, pra passar cola pros outros, muitas vezes até fazendo a prova por eles. Resultado: Você não terminou nem entregou a sua prova, não aprendeu o que tinha pra aprender. Deixou de viver coisas lindas que estavam reservadas a você, e também tirou o direito dos outros fazerem as provinhas deles e aprenderem por si mesmos.

Além disto – nesta hora o anjo tomou muito cuidado, escolhendo palavras que não deixassem a célula do olho ainda mais chateada – lembra aquela vez que o nariz bateu numa porta de vidro, na vitrine daquela loja de quinquilharias a R$ 1,99 no shopping?
– Ahã – respondeu a célula do olho, consentindo.
– Então, continuou o anjo, isto aconteceu porque naquele momento a corporação para a qual vocês todos trabalhavam (também conhecida como corpo ou ser humano) teve um lapso de visão e não pode calcular a distância entre a cabeça e o vidro da vitrine.

– E aquela vez em que o coração ficou extremamente triste, e você sentiu que tinha que ajudá-lo a superar a crise pela qual passava, você se lembra? Perguntou o anjo.
-Sim, sim! Respondeu a célula do olho.

-Naquele dia – continuou o anjo – o ser humano para quem você trabalhava pensou ter visto a pessoa que ele amava dando um beijo em outra pessoa que não seu namorado. Mas a pessoa vista não era a namorada dele. Seus olhos, cansados e míopes, não tinham a definição de imagem porque lhe faltou eficiência na célula do seu olho, mas a mente criativa daquele ser acabou inventando uma história negativa e mirabolante, um ponto de vista errado que posteriormente acabou se cristalizando na crença de que não é seguro amar. Você sabe, né? Seres humanos nem sempre usam a criatividade para seu próprio bem e costumam ser inseguros, apegados e ciumentos rs… Na ilusão do mundo humano, a estrada do caminho do medo parece ser bem mais larga do que a do caminho do amor.

– Você percebe? Emendou o anjo. Ao tentar fazer o trabalho dos outros, você deixou de fazer o seu, e direta ou indiretamente acabou prejudicando a todos!

– Sim, disse a célula do olho. Eu tinha tudo para ver as coisas mais lindas do mundo, mas nunca pude enxergar as oportunidades que estavam bem na minha frente!

– Mas está tudo bem, disse o anjo.
Você fez o melhor que pode com a informação que a maturidade da sua consciência naquele momento dispunha.

– Agora, completou o anjo, nós lhe daremos uma nova chance.
Dessa vez, lembre-se de que seu trabalho, célula do olho – ou qualquer que seja o novo papel que você receba para performar enquanto se experimenta vivo, será apenas olhar e apreciar tudo à sua volta. Sem a pretensão de corrigir ou consertar nada lá fora. Apenas estando em paz com o que vê – e trabalhando para estar em paz internamente com tudo aquilo que estiver enxergando.

 

“Compaixão é aceitar as coisas exatamente como elas são”
Adamus Saint Germain

 

Você que agora está lendo isso, é uma célula, parte essencial num organismo muito maior chamado Universo.
Seu trabalho é ser a melhor e mais feliz célula que você pode ser. Sem tentar consertar, arrumar, corrigir nem fazer o trabalho de ninguém mais. Com isso, você estará fazendo o que de melhor pode fazer pelo Todo do qual faz parte: ser grandiosa e gloriosamente você!



  • Que conto mais lindo 😍
    Assim minhas células dos olhos choram… rs
    Na verdade, reativou os meus sentidos, também dei risada, me comovi e compreendi o que é simplesmente contemplar!
    Gratidão por essas palavras lindas, minha escritora favorita 🐞🌟❤️

    • Que alegria de feedback!
      Escolhi hoje me experimentar numa escrita um pouco diferente rs
      Na mentoria ontem Saint Germain sugeriu contarmos mais histórias, e veio esta!
      Fico muito contente que tenha ressoado aí, minha anjinha de luz!

  • Estava eu justamente lendo a mensagem que deixei para alguém, me oferecendo para ajudar no que eu pudesse, sobre uma questão que ela dizia ter falhado e não saber como agir.
    Tantas outras vezes fiz isso com tantas outras pessoas… E me dou conta, agora, que nem sempre sou “generosa” assim comigo mesma.
    Obrigada por me permitir esse insight, ainda mais com um texto tão delicioso de ler.
    Gratidão.

    • Pois é, Reny!
      A gente tende a estender o tapete pro outro – e às vezes esse tapete é a gente mesma, né? rs
      Gratidão por sua presença aqui! Foi muito gostoso ler seu comentário 🙂

    • Que alegria receber sua visita aqui, Camila!
      Gratidão por suas palavras e pela sua linda jornada! ❤️

  • Ahh… procurando outra coisa sua agora reencontro esse texto lindo de 1 ano atrás! 😍
    Que presente ❤️
    O melhor sempre me encontra! E você é o meu canal favorito 🌟
    Gratidão, lindeusa amada!!!

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